Thursday, December 28, 2006

Sem norte

Vaguei noites vazias em selvas escuras
Na mão a minha bússola: você
Meu corpo cansado, moído, quebrado
Aturava os castigos do caminho
Sabendo esperar você

No seu jeito de falar
Ouço o tilintar do cristal quebrando

Meu desejo era maior
Segui ao seu encontro

E a saudade e a solidão da vida minha
Me fez de novo sua até suar

De um salto, um susto, um cisco nos seus olhos
Senti que algo estava por findar

Com os pequenos cacos que sobraram
Talhou a minha pele de lamúrias

Do meu silêncio fez-se a escuridão
Tomou a minha alma por luxúria

04/11/2006

Sunday, December 24, 2006

sóbrios

eu estive sóbria por alguns dias
e o que posso dizer sobre isso?
que senti falta do conhaque puro baixando pela goela?
que senti falta do som alto saindo pela goela?
a plenos pulmões
um desamor completo

a chatice do dia a dia me desespera
eu preferia estar dopada
eu preferia estar adoidada
eu preferia que você tivesse gozado por toda a casa
como fez um dia

seus "eu te amo"
vem acompanhados de atitudes de fuga
não se entrega
e eu com a maior paciência do mundo

me ligue quando estiver sóbrio de todo esse movimento de fuga
nossa vida não é uma ópera

invenções

Você não existe.
Só existe quando está perto de mim.
Eu invento você, seus passos, suas falas.

Todos entram aqui e saem com respostas.
E quem me dá as respostas?
Talvez eu não esteja fazendo as perguntas certas.

Você tenta me indicar caminhos
Mas custo a acreditar na viabilidade de segui-los.

Um homem que inventa uma mulher.
Apenas o sexo foi real.
Todo o resto foi invenção das falas.
Apenas o gozo foi espontâneo.
Todo o resto foi pré-programado.


E assim não saio daqui para a rua.
As minhas necessidades são atendidas
como serviço de entrega.

Amor venha...
e o amor vem.

Amor fique...
e o amor fica.

As idéias desconexas podem até fazer sentido
vez ou outra.

Este é um espaço mágico de criação.
eu estou inventando esse amor.
sempre a cabeça
nunca o coração

cabeça e sexo
e eu crio o amor.

tudo para nós
é sempre num lugar lá fora.
é vento, verde, sol
mas a gente não sai daqui

porque não sabemos inventar verdades
você é apenas uma pessoa
que me permite falar na primeira pessoa do plural.
Você é a minha primeira pessoa do plural.

ninguém entende o que escrevo, o que penso, o que invento
porque sempre estou criando coisas novas

e posso até inventar que sei fazer pão
e posso até inventar que tenho um filho

e posso até inventar uma nova cara
um novo cabelo
um novo elo

eu invento tudo
crio tudo

e me sinto sozinha depois de tudo.




eu sei que vc escreve a mão
e eu inventei que não te amo
inventei que não te quero



eu inventei a doida
e todos acreditam

eu não quero mais inventar nada
é isso mesmo
tenho que escutar mais
ficar mais tempo muda

vou ficar imóvel
esperando você me tocar

e não vou dizer mais nada sobre o que sinto
vou esperar pra sentir quando você estiver aqui

super-heróis

amanheceu às 3h da tarde

antes disso você me via dormir
velava meu sono
é disso que preciso
de você zelando por mim
seu carinho
entrar no seu mundo de mansinho
colocando a imensidão no bolso da bermuda
e porta adentro nos despindo de tudo
apenas os sonhos
apenas os brilhos
dos olhos
dos planetas a nos alimentar
das fagulhas da nossa fogueira santa
por que me queima?
quer me purificar?

mal sabe você.. que o que você me faz
é me fazer voltar
voltar a ser o que eu era
antes de estragarem toda minha pureza
antes de eu renunciar à minha beleza
antes de eu matar todas minhas certezas

eu serei
o que sou
e sempre fui

pra você
se você quiser

se tentar entender minhas palavras
vai se perder no labirinto

mas se tocar minhas verdades com a palma da mão
vai sentir tudo como o que realmente são

você está abrindo uma gestalt em que o essencial salta aos olhos
toda essa gosma em volta
é por onde vou nadar
até chegar a você

eu ainda não desisti
isso é bobagem
só estou aqui pra receber
é a sua hora de quebrar a casca
de sair da barriga da abelha

é a sua hora de correr pra mim
com a velocidade da luz
pra explodir no meu corpo
com o líquido proibido

meu desejo por você está aqui

não quero nem dizer que te amo
meu 'eu te amo' hoje é carinho, um afago no ego

o dia que eu disser eu te amo
pra confirmar o que sou no que você é
aí sim
vou dizer com lágrimas nos olhos
eu desde a primeira noite
me joguei em você

e não me arrependo
mas o dia a dia está me matando
espero que me entenda

preciso de Baco
pra que meu amor me tome

e se derrame das minhas pernas nas tuas
escorrendo pra você sentir

eu quero sentir teu corpo
quente
pulsando
seu coração batendo

você deixou desejo

eu apenas rio das suas restrições
acho que já percebeu que pra mim elas são nada

apenas você não conseguiu deixá-las pra fora daqui

quando vai perceber que aqui é o lugar de deixar as máscaras?
de fazer sumir as fantasias de super-heróis?

aqui é o lugar pra ser o super-herói
não a roupa
e sim o ser

Wednesday, December 13, 2006

meus três últimos cigarros




meus três últimos cigarros

não posso mentir que guardei pro final
os 3 últimos cigarros ficaram guardados

no fundo do armário
na prateleira de trás

eu tentei escondê-los
eu tentei não fumá-los agora

mas precisei deles

o primeiro fumei por desespero

por solidão

por não saber o que fazer

e coloquei sua bituca em pé pra que apagasse sozinho longe de mim

o segundo fumei por impulso

por conforto,

pra tentar fazer durar,

esticar o tempo que fica flácido

e nem dá mais vontade de fumar

o terceiro não fumei ainda

porque o segundo está apagando entre os meus dedos enquanto escrevo

o segundo se apagou

que alívio não precisar sentir coisa chata

pro terceiro eu quero uma lágrima

que está seca por causa da fumaça imaginária que está saindo de mim
pro terceiro só teve um suspiro
uma vontade de não queimá-lo

pro terceiro um numero mágico
uma forma perfeita
três ângulos

pro terceiro
não..
pra mim

o terceiro é pra mim
só pra mim
é o último o recente o reticente

o terceiro vai me trazer
vou te acender

te acendi dentro de mim
o terceiro foi aquele que a tereza deu a mão

o terceiro foi aquele que a certeza deu a mão

pra você eu dou a minha mão
mas você não quer

e a lágrima veio
molhou meus olhos
mas não saiu

você não sai de mim
eu estremeço
eu te mereço

te suguei o mais forte que pude
e minha traquéia doeu

eu sinto muito
eu preciso muito
te pedir perdão

o que foi que eu estraguei dentro de você?
quero guardar as suas cinzas na caixinha
porque sou fênix
e só posso renascer das tuas cinzas

cigarro eterno de uma mente de lembranças
você ilumina
e até o sol pousou na minha janela quando você se foi
eu vou procurar você atrás das cortinas
não brinque assim de se esconder
eu quero te achar bem aqui
e se você não estiver
eu vou arrancar essas cortinas
nessa sina cega de surtar sem segredos

você molhou a minha boca
eu

eu
eu preciso eu quero
te espero se você precisa disso

eu estou me matando pra te proteger
eu estou chorando pra não te esquecer

quem é que vai me curar de você?
não deixe tudo pra eu fazer
não insista pra eu crescer

não peça pra eu trocar de roupa
me aceite do jeito que eu sou
eu não quero te mudar
só quero que você me deixe entrar

sem essa de deixar a porta aberta
eu quero que você carregue a chave

me despertaram de você, meu sonho lúcido
porque eu tenho essas coisas pra fazer

e estralei meu dedo sem querer
quando te amassei no cinzeiro

porque te apaguei
mas você tá aqui

e me mandaram uma mensagem
SAVE
me salva e me poupa
sempre um pouco
pra ter sempre mais

os seres e os sentimentos

os seres sem sentimento
e os seres que sentem demais
sentimentos variados se esvaziam
de um sentir sempre a mesma coisa invariável

os seres sem sentimento
e os seres que sentem demais
são seres de catavento
rodando pra dar cor ao movimento
do ar que pela força vão sendo usurpados

toda vez que eu amo alguém
deixo de amar um pedaço de mim
que era meu e eu não sabia
e não sabia que doía

não
eu não quero me repartir
eu prefiro preferir
escolher falsamente
o que vai o que vem
o que fica

e é assim que o ventre explode
com a maior sutileza do mundo
tudo o que eu não quis deixar sair
arrebenta as barreiras do que sou
e me faz estilhaços de mim
num espelho sem imagem em que me enxergo
inteira
intensa

é difícil encarar os avessos
é difícil descobrir-se ao contrário
é difícil ler palavras no espelho

ainda mais quando escritas com vermelho

profeta

eu nao sou profeta
porque não quero enxergar as imagens do futuro

eu simplesmente profiro palavras que ecoam o futuro no coração das pessoas

beijos e partos

chegou o momento
em que distribuo beijos
que se esforçam pra nascer
como em trabalhos de parto

dói em mim ver a vida que nasce da minha boca
sofro e choro com a tamanha brutalidade
com que sonhos entram e deslizam pela minha língua
de como esses sonhos de outros
precisam da minha saliva pra se umedecerem

e a força que trago nos dentes
faz do risco um rastro
de sangues e suores
manchando os lençóis

manchando o branco

e é apenas o choro primeiro da vida
aquele susto quando o ar invade os pulmões

e é a partir daquele corte com a casa que me protegia
quente e úmida como um beijo de corpo na alma
que eu sou obrigada a abrir os olhos
e a plenos pulmões
respirar ar puro

Thursday, December 07, 2006

Sem se adaptar

E eu precisava sair
E eu precisava ficar
E a gente se despede
na porta, na rua

Eu te amo
Me perdoa
Me entenda sem me entender
Me aceite
Não me peça pra me adaptar

Nosso egoísmo
Somos dois tiranos mimados
Tentando discordar

Mas a gente só concorda
Só acorda
Um do lado do outro

Não tente se adaptar
Tente apenas esquecer
o que te faz precisar pensar
o que te faz precisar escolher

Eu sinto tudo assim
sem explicação

Um prazer
Uma incerteza certeira
Nos acordes e nos versos de uma canção

Tuesday, November 21, 2006

esquecendo nas esquinas

a primeira coisa que esqueci de você foi seu sotaque
aquilo que o torna tão peculiar
também esqueci sua voz
que até há pouco ainda estava ecoando na minha cabeça
também não lembro do seu beijo
e nem de como ele era bom

tenho ainda uma lembrança vaga da sua boca bem desenhada
lembrar da sua boca é lembrar do seu beijo, sua voz, seu sotaque
prefiro guardar um enquadramento longínquo da sua boca
suspendendo o resto todo: beijo, voz, sotaque
isso eu consigo

esqueci seu cheiro
não lembro nem de nada parecido
seu calor já tá bem longe de mim
esfriou o meu corpo e o meu desejo de você

aquela música que tocava na minha cabeça
quando a gente tava junto
também não me lembro
as coisas que você me ensinou
já desaprendi
as mil e uma coisas que você disse pra eu rir
também já não estão mais na minha memória
tudo o que você deixou em mim eu já não consigo enxergar

só seu carinho ainda está aqui
na minha pele as marcas invisíveis do seu toque
minha pele ainda sente falta das promessas mudas que as suas mãos fizeram
mas em qualquer esquina eu ainda hei de esquecer
isso é fácil resolver

agora os seus olhos ainda não consegui afogar
tá difícil
lembrar dos seus olhos é lembrar do seu desejo
e da imagem de mim que mora neles
uma imagem bonita de se ver e sentir
é difícil esquecer de mim

esquecer seus olhos eu nao sei
mas um dia eu hei
eu sei

16/11/2006

Tuesday, November 14, 2006

Encontro sem desencontro

Esses versos pra você
Só poderiam ser escritos à mão
Com curvas e desenhos
Com o corpo e o coração

As voltas que o mundo dá
As voltas da minha letra corrida, correndo, voando

É a idade do céu
que está brilhando nos meus olhos
É o tato da língua, do céu da boca conhecendo o mundo do seu beijo
Engoli com a saliva os seus mais secretos desejos

E era de novo eu distraída pelo ar
Vagando com sorrisos e canções a tiracolo

Eu quero assim poesia todo dia
Com palavras que digo e que guardo
Com palavras que eu crio quando rio

E as cócegas na alma
A brincadeira
A hora de tomar a saideira

Mas não é assim
Você não sai de mim

Talvez seja uma nova canção
Ou um filme antigo na TV

Eu só vou dormir um pouco
Logo a gente se vê

14/11/2006

Sunday, November 12, 2006

Enxergue!

**
Desejo manter
As coisas sem cor

Desejo manter
Passos ao meu lado

Desejo não ter
Amarras em mim

Desejo
O que esperar disso que sinto?

Adoro quando sou sincera.
Minha alma não se esconde por entre vãos
ela se espalha.

Seus olhos não são verdes nem azuis..
são castanhos...
e no entanto são sensíveis a luzes artificiais.

O que você olha é com medo,
olha o nada sem nada mirar.

Mas se olhar direto nos meus olhos vai enxergar.

Caça e caçador

**
A cama enorme comigo e sem tigo.
Você me insulta com esse ar de independência.
Só eu sei o quanto implora por castigos.
Só eu sei o quanto gosta de agrados.
E mesmo assim, essa independência nata.
E mesmo assim sai correndo pela mata.

Você, que não sabe nada de ser bicho ou de ser planta.
Apenas um impulso básico, sem detalhes.

Bicho caçando.
Não é água ou alimento o que precisa.
Não é cópula.
O que você caça é aventura.

Minha única imaturidade
é não saber lidar com esse mundo que se me apresenta.
E você nem quer saber.

Você desliza por entre todos os espaços desse mundo cruel.
Acho que me apaixonei por um ser de outro planeta.

Wednesday, November 08, 2006

Fim do mundo

O poeta ia bêbado pra casa
não queria ver a aurora.
“Ninguém mais chora por mim
como chorava Aurora”
Na casa onde chorou por ela
Uma luz feliz e amarela
escondia outros segredos,
não os seus.

O mundo ia acabar
E o bebê crescendo
O mundo ia acabar
E o bebê sorrindo
Às 7 e 58
o bebê dormindo.

Aurora amava os homens
– eles todos!
O poeta amava Aurora – ela inteira!
Mas não sabia, não percebia e se arruinava.

O mundo ia acabar numa canção.
I’m wondering round and round nowhere to go...

1998

Busca

As estradas começam a ser percorridas
porque se fazem de concreto sobre o solo
correm-se contra o tempo
miram-se para o nada
e por onde vão...
por onde ficam...
trazem você pra mim.

Eu sempre deixo rastro
e é você sempre que o segue
Nem que outro, nem que negue
perde-se o sonho que tive
fica sempre só.
Saudade de você deixa saudade
Coragem de voltar volta pra mim
Continua a saudade contínua
- pela estrada afora...

Tantos temas e dilemas
que atravessa nessa estrada errada
fazem fazer amor
só pra fazer você voltar.

1998

Uma sala repleta de panfletos desconexos

Os CDs espalhados pelo chão
O gato dormindo em cima das poesias
Jogadas no sofá as tarefas da escola estão
As músicas já tocam por todo um dia

E só agora percebi que está chovendo s isso é mal
Queria saber de onde tirar animo para voltar à vida real
Como obrigação não dá não!
que sujeira!
que coceira!
Que você ainda queira.
Senti teu gosto.
Passo a mão na cabeça.
Suspiro.
E não choro, esqueça.

1997

Determinação

Determinado
De ter minado
De ter terminado

Determinada
Deter-me a nada
Deter-me nada

1997

Caro amor caro

Caro amor,

Sou doente e às vezes me esqueço
Esquecer é o alívio da memória
E de lembrar vive a nossa história

Quando eu a quiser matar
Vou lá e faço
Mas para de novo amar
Vou esperar um primeiro passo

Nem tem mais chances
de eu procurar um pré-suposto
Porque pelos mágicos nuances
Tenho que pagar um alto imposto

1997

FRASES VENTIAS

São frases
Que falo
que escrevo
pra ti.

São coisas
que sinto
e que nunca
senti.

São dias
tão longos
sem você
aqui.
São vidas
que cruzam
com as que
nunca vi.

1997

(parênteses)

Estou me perguntando
onde é que foi parar minha alma
Quando você estava aqui
eu me sentia nós (que piada)
e agora que você quis ir (nem veio)
Não sei onde está o nós (nunca esteve)
não sei onde está você (nunca soube)
não sei onde estou.
Quanta coisa foi embora sem eu querer (nunca tive)
mas já que você quer assim (não sabe o que quer)
o que é que eu posso fazer? (nunca faço)
Sinto minha alma vagando pelo espaço
no plano das perguntas (sem respostas)
E agora essa alma que sofre, chora, dói (mais séria que desesperada)
luta para ter alguma coisaem que acreditar, (acredito em mim, quem sou?)
já que o amor não dá em nada
e a amizade está estragada
e a vida toda desgovernada
e o objetivo se perdeu (qual era mesmo?)
Foi para longe.
Só me resta...
Esperar meu amor passar. (só esperar?)

1997

Romeo and Juliet 2

Look at the skies of London London
they are gray
I’m here today

Can you hear me?
Can you let us be?

Forgiveness
For give HAPPYness

1997

O final da história real

Sssssshhhhhhhhhh! Ela está dormindo!
Bem que eu falei que ela gostava de neném.
E era justamente por gostar que não queria.
Tinha medo de fazer mal à criança.
Tinha medo de passar-lhe pelo umbigo
seus pensamentos que contaminassem
porque ela tinha muita dor consigo.

Se fosse em próprio ventre tinha medo
Mas de tanto o corpo ela cuidar,
mais de nove meses sem o usar,
a alma inteira se entupiu de nada.
De um nada lindo e prateado o cinza.
Um nada calmo e desesperado.
Porque tudo passa de passar
E o desespero dela era o de ficar.

Quantas dúvidas, quantos nadas
que quando expressam páginas viradas,
descompassadas do correto ritmo
que surpreende tanto até os ígneos.
Da novidade ela extraiu cansaço
pois com mais sol e peso deu suor,
e com mais sins e nãos se fez a dúvida.

Mas bem que os nove meses não eram dela
– e que passaram num sopro de tempo.
Quando ele foi fugir do seu tormento
fez colorida a poeira de voar com o vento,
enegrecida a sombra de chorar a chuva.
E então de nove meses esquecidos
– fora o brilho de esquecer inicialmente -
fora o medo de lembrar a todo instante
veio-lhe a notícia assim de repente.

Senhora nova, era menor de idade.
E sempre escondia o que pensava e bem.
Mas agora que embalava a neném,
ela mostrava a dona que não ia ser.
Ela já era - e isso ninguém discutia -
alguém que sabe e ama docemente
o terno silêncio da neném dormindo.

Então dormia a nenenzinha dele
- que não era dela e sim de outra moça -
Contudo ela nem se lembrou da dor.
Nem lembrou dele - antigo amor negando.
Nem lembrou a si - antigo amor sofrendo.

Quando ela embalou a nenenzinha
se esqueceu que um dia tanta confusão
a envolveu sombrio o próprio coração -
que lembrou-lhe o feto o fato da renúncia dele
... em vão.

Ela sonhou os nove meses todos.
E a vitória veio em forma de criança,
beijou-lhe a alma do corpo que não a carregou
e soprou pra longe a desesperança.

1998

London, London

Em bálsamo
uma linda canção que diz
da procura da figura diferente
das coisas concretas de concreto
que pudesse tocar profundamente

um coração

sem escolha
sem dor
sem explicação

1997

Tuesday, November 07, 2006

Pela janela

Quando o raio de sol pousou nas folhas
E iluminou o verde
Lembrei da aliança dourada
Reluzindo em seu olhar

Quando as nuvens manchavam e desmanchavam o céu
Com nuances de branco, cinza e luz
Lembrei da nossa velhice salva guarda

Quando a mata escura se embrenhou no mato
Lembrei da selvageria de nossos vícios
Encharcando nossos pés no lodo
Encantando cobra e aranhas
E outros animais peçonhentos

Quando da terra sem mato
Lembrei de toda erosão que causamos um ao outro
Do hiato entre nós
Da força bruta que nos separou

Que a chuva lave tudo o que esse amor manchou

Corpo

Apague essa luz

Cansei de estar exposta
Não existe resposta
Não existe pergunta

Eu sou um homem triste
Dançando distraída
num corpo que se nega mulher
Enquanto o homem do campo
De posse de seu rastelinho
Se esforça para tirar
as pragas de seu caminho

Eu estou em outro plano
Apenas piso nas pragas
E elas secam
diante da minha presença

Eu sou mãe do mundo

Nasci para alimentar
E meu único alimento
É a morte e o nascimento

Ciclo misterioso

Uma procura quando parece que não tem saída
Ou quando não se quer ver saída
a não ser esta, à francesa, pela direita

Entrando, atravessando o portal

Nunca me lembro exatamente como começa
Só sei que descamba na música
Uma melodia
Alguns versos cantados
A cama de dormir
Olhar pela janela e se descobrir

Desejos por outras pessoas que não estão ali
Confidências de frustrações
Lamúrias de amor perdido

Risadas, ironias
Mentirinhas gostosas de falar e ouvir

E daí percebendo que o eu não se entrega pro outro
por completo, por complexo, por que mesmo?
Não existe o nós

Aí os monstros saem
Vão dizer que é por causa da bebida
Vou dizer que é por causa do silêncio
E do movimento de recuo

E os monstros trepam
Não fazem amor

Aí eu durmo
E quando acordo... é só constrangimento

Deveríamos apenas nos desmaterializar
Ou ficar invisível o eu para o outro

Porque não quero enxergar
E não quero que me enxerguem

As despedidas são ridículas
Cômicas e crônicas

Tchau tchau

Tenho vondade de rir, de expelir
Aí ...pluft... nuvem se desmancha

E, finalmente, a sós comigo
Cato a poesia que ficou no ar
no corpo, nas paredes, nos copos,
nos ouvidos uma voz me incomodando
Pare de falar na minha cabeça
Quero ouvir a mim

Me dá espaço
Quero emergir eu

E quando escrevo... me reconheço.

Sim, sou eu de novo.

Isso é apenas interação homeostática.

Sunday, November 05, 2006

raízes plantadas em vasos

Liberdade não é você poder fazer tudo.
Liberdade é você conseguir fazer tudo o que precisa.

Talvez esteja errada em sair assim, como costumo sair,
sem dar satisfação a ninguém.
Mas eu tenho que me proteger.

Não gosto de mentir.
Acho que mentir não é viver.
Toda vez que alguém mente, deixa de viver a realidade.
Mas eu preciso me proteger.

Você me pergunta por que vivo na defensiva.
Aprendi a ser assim.
Porque eu, na minha "amoralidade" dizia tudo, era transparente.
E o que fazem com isso? Usam contra você.

Quantas e quantas vezes tive que esconder, mentir.
Pra que ninguém, ninguém ficasse me dizendo que era errado.

Liberdade é um valor pra mim.
É uma necessidade.
Será que nossas almas estão livres?
A minha esteve por muito tempo,
todo o tempo em que te amei.
Mas agora, sinto que ela não está mais.
Pois não quer sair de perto de mim.
Da vida que plantei aqui.

Não tenho raízes, mas mesmo assim
planto a vida em pequenos vasos
pra que eu possa levar comigo aonde eu for.

2001

Catar palavras

Catar palavras
Catar outras coisas?
Catar gentilezas, Catar coquinho!!!!
Catalogá-las de azul.
...Lembrá-las vermelhas.
Matá-las, vertê-las.
Destruir pesadelos,
Tentar entendê-las
como o que realmente são:
Um bando de sentimentos vãos
Mistura de silêncios absortos
Que caem nas tempestades
E falam a quem quiser ouvir:
Isso é sentir!

Enfim

Enfim
Sabe qual é o problema do Enfim?
É alívio de sentir um fim
Estar num fim
Gostar de um fim.
Enfim
Tem que terminar
Fim

Saturday, November 04, 2006

como um haicai

by Isabela Mendes & Paulo Eduardo Gonçalves

como assim?
não sei como
mas como sim

citação

"to bem... to sozinha agora" MENDES, 2006

MENDES, C. Conversa de irmã. Capítulo 22. MSN: Ponta Grossa, 2006.

Friday, November 03, 2006

CONFUNDIR

acender a fagulha
da vontade de buscar
respostas

11/07/2004

Poema para um inverno do passado

Em mim há lugar
para o conforto e o conflito

Quando te olho
meu olhar não reside ali
Vai além, buscar algo que perdi

Quanto mais estabeleço a ponte
Maior ela fica
Mais extenso é o caminho

Embora na tua frente
o fio luminoso que nos liga cresce
e faz dessa busca algo interminável.

Talvez por isso
tudo se embole.
Nada se esclarece.
Nada se confirme.

Amar você
é cultivar esse fio
infinito
e
impossível.

11/07/2006

Tuesday, October 31, 2006

poesia de cego que gritava luz

sempre tola
brincando com as feridas

enquanto existe quem dance na corda bamba

preciso aprender a pedir perdão

você desata todos os nós
e faz nossas vidas uma só

eu gosto de ter isso pra viver

talvez eu esteja sofrendo por não querer
fugindo pra não pensar no assunto

só você sabe da luz q eu coloco no caminho

você tem sempre o melhor de mim
talvez isso me irrite

entre nós os jogos de poder são apagados pela sensação de pertencer

esse é o nosso caminho
com pouquíssimos espinhos
sem soberba

pra você eu não sou isabela mendes
sou apenas aquela menina de trança
que te beijou na escada
de blusa rasgada
e que agora te pertence

e essa vida cotidiana me assusta
suas certezas me assustam
essa mulher que me tornei me assusta

eu quero brincar de vez em quando
sem assumir responsabilidades

mas o nosso prazer é sempre o amor
mesmo nessa vidinha yuppie
há espaço pro amor

o amor que exala do meu corpo
e só responde ao seu toque

porque você me entende sem me entender
porque queimamos a paixão
e soubemos fazer dela o amor

às vezes eu preciso me perder pra me achar
talvez por isso eu deixe a casa bagunçada
pra ter aquela alegria tola de "achei!"

divertido reinventar o amor a cada dia

sem medo
o "nós" sempre supera as tempestades
e também os dias de sol muito quentes

o “nós” é muito mais
do que essa minha solidão voluntária
disfarçada de multidão
que você tanto odeia

sem medo
tudo muito mais do que se imagina

ao meu lado
nosso projeto de vida
saindo do papel

você tem coragem de cumprir o plano
e quando eu desisto você me faz lembrar
e quando você desiste eu lhe faço lembrar

nossa vida é assim
sempre um par

31/10/2006

Monday, October 30, 2006

cegos voluntários

Nunca imaginei que em meio a tanta desilusão
houvesse espaço para essa alegria

enquanto eu mirava o passado
o futuro me puxava para frente
trazendo realizações

qualquer dia
pode ser feito de tempo
um tempo que não consegue saber se foi, se é ou vai ser

fora a poesia
não tenho nada
apenas um olhar infértil sobre a estrada reta
quando esqueço de ser
ler, pensar, sentir, expressar

parar no tempo sendo nada
faz das misérias apenas detalhes vãos da paisagem

e os amores distantes de mim
parecem apenas espectros
como ter certeza de que era eu ali ao seu lado na fotografia?
um amor de ópio e apagamento
não poderia durar tanto tempo

antes pular do barco
do que ficar até o naufrágio

então entrego minha existência
à contemplação do mistério

no meu corpo escrevo essa história
poemas em minhas costas
que eu não posso ler

e as minhas dúvidas ecoam pelo ar
encontrando outras mentes
que também de asas quebradas
se esforçam em cantar para o mundo

mas o cântico é uma bondade que machuca
uma tristeza que anima

e as cores esperam por uma outra luz
para produzerem diferentes nuances
na retina dos cegos voluntários
que fecham os olhos enquanto
a vida explode em cores
numa aurora boreal

Sunday, October 22, 2006

A SEMENTE DO AMOR

domingo, 12 de agosto de 2001, 19:01:12
ao som de "Beatriz" com Ana Carolina, "Relicário" com Cássia Eller & "O mundo anda tão complicado" com Legião Urbana

Será que é mentira
E que eu nunca mais alcançarei a verdade?

Sei que estou perdida
E não percebo mais as placas de desorientação
Não há razão para não acreditar,
Mas mesmo assim...
Insisto em duvidar

O mundo está ao contrário
Sempre esteve
E porque comigo tudo é sempre diferente?

Peço mil perdões
Por essa carta sem fim
Onde quero acabar com tudo
Jogando tudo do décimo andar desse prédio comercial
Jogarei nossos filhos que não tivemos
E todos os nomes que escolhemos para eles
Jogarei todas as fotos, os fatos
Que nunca aconteceram
Romperei todas as madrugadas
com as auroras implacavelmente anunciando o novo
Anunciando que a sua noite acabou
quando o que não queremos é perder nossa noite especial
Quando queremos segurar aquilo que não existe
E vem a manhã com seu o frio e a frieza inevitáveis
Acabou o calor
Você vai embora e tudo não passou de um sonho
Um sonho volúvel que nunca há de se realizar
E eu minto pra você, porque você me pede
Minto que teremos tudo isso
Minto que eu não estou cansando disso tudo
Guardo a desilusão só pra mim

Vamos jogar o seu jogo
E inventar suas canções
Vamos então viajar nessa ternura
Que eu prometo te fazer carinho enquanto outra não vem
te preencher esse vazio
Posso preencher seus dias com minha presença
Já que você não sai de casa
Ficarei com você quando você quiser
Mas não derramarei mais nenhuma lágrima
Acho que já desisti
Tudo jogado no chão espero que eu não morra,
Que a queda não seja tão brusca
Joguei tudo fora
Num redemoinho de vento
Estava lá tudo o que era cor de rosa
Todo o sangue
E eu morri
Morri pra você

Não quero mais ficar sonhando
Queremos o impossível
Não a distância,
e sim os motivos que nos uniram
os desejos inconcebidos
Nunca vamos morar juntos
Talvez nunca exista uma conclusão
Talvez eu não agüente tanto romantismo
Talvez eu não suporte seus horários
Talvez não tenha forças pra sair do meu lugar
Deixar a segurança do meu mundo
Talvez você nunca me beije
Talvez a gente nunca se encontre
Talvez a gente nunca alcance o que buscamos
Talvez em nossas mentes exista mesmo esse lugar seguro
Que nos faz ficar juntos por qualquer inexplicação
Talvez você só fique guardado aqui
E nunca venha me fazer feliz

Talvez tudo o que prometo
Não passe de vontade minha
Talvez eu não tenha esse mundo belo pra te dar
Talvez a minha cama tenha que continuar sozinha
Talvez eu tenha que continuar sozinha
Talvez as coisas tenham que ser assim
E não podemos ir contra a ordem natural das coisas
Isso é pecado
Talvez eu nunca veja uma lágrima sua caindo por mim
Talvez seja fácil esperar sentados cada um na sua casa
Encontrando um pouco de alento
Não que isso seja o certo
Não adianta tentar entender
Não adianta tentar explicar
O que será que sei?
Acho que não sei de nada
E esse nada me toma
E o nada que acontece
O nada me arranca o que eu nunca tive
Não adianta querer te buscar no meio disso tudo
Só quero pensar no que sinto
Só quero sentir o que eu sei
Só quero saber de mim
E mesmo assim
Lá está você
Como uma maldição
Tenho que aceitar minha vida do jeito que ela é
E parar de buscar as coisas fora
Tenho que buscar dentro
E por que você está aqui dentro?
Por que quero tatear o que tem fora
se o que importa é o que está por dentro?
Por que quero lutar contra isso???
Por que tantas dúvidas?
Por que esse nó na garganta?
Por que me seguro pra não chorar?
Por que te procuro?
Por que fujo de você?
Por que fecho os olhos pra pensar em você?
Por que tento me afastar
mais longe do que já estou?
Por que você disse que eu tenho medo de mim mesma?
De mostrar quem eu sou?
Por que você me descobriu?
Por que você?
Por que às vezes pareço que posso te dominar?
E por que às vezes eu fico assim tão indefesa?
Você naum sabe nada da minha vida
Dos lugares onde esive
Das pessoas que eu conheci
Que me feriram
E que eu feri
Não sabe do que eu já fugi
Não sabe que eu não me encontro mais
Por que tem que me fazer pensar nisso assim tão profundamente?
E é pensando em mim
que vejo o quanto gostei de você
De você ter aparecido
na minha vida
Minha vida imaginária
Que eu fiz pra mim
E você veio morar no meu mundo perfeito
Sim... ainda é cedo
Tenho a tarde inteira
Pra ler um livro
E estudar sobre a comunicação popular
Sendo que eu me apaixonei por telecomunicação
E extrapolei
Tudo o que existia pra extrapolar
E ainda assim
Não cheguei nem perto do que poderíamos ter feito
Me tranquei nesse mundo de idéias, sentimentos, pensamentos
Nada me atinge na carne
Nada me vem pelo corpo
A não ser esse arrepio de quem sentiu você aqui
E era tudo mentira
Você não estava aqui
Nunca esteve
Era só o que eu senti
E eu não sei mais pesar os dois lados da balança
Não sei o que vale mais que o quê
Mas vou ver se você está no ar
Que seu corpo deve estar em algum lugar
O corpo que talvez eu nunca chegue a tocar
e lágrima por lágrima não ouso negar
que eu queria entrar na sua vida
como o sol entrando pelas janelas
numa manhã que acorda a gente
assim, de repente,
e dói ter que parar de sonhar
e levantar da cama sem você
e sair lá fora
onde tantos podem me ferir
e nem sabem
nunca vão saber
assim como você que pode nunca saber
o quanto eu morro de amor por você
Todos os dias um pouco
Todo o pouco que eu tinha
Não sei não sei se é culpa minha
eu só queria poder fazer de tudo um pouco de poesia
pra provar para o mundo
o quanto o amor pode ser criativo
e o quanto ele não mede as coisas
pq o amor não tem medidas
nenhuma porta de saída
mesmo assim como eu
correndo de tudo
entregando o tesouro
pra qualquer bandido que me diga mentiras
É amor de mentira
porque não cabe na minha vida
E então você vem
e nunca vai saber o que acontece
Eu vou dizer oi toda alegre
e tentar falar das coisas mais banais possíveis
e tentar sufocar o amargor
enquanto tento te fazer seguir
pelo caminho que eu nunca escolhi
um caminho de flores brisas
um caminho ameno e agradável
E eu não sou nada disso
E eu juro que não sou o que digo
Eu sou o próprio perigo
não julgue que me conhece
Eu te toco no infinito
incalculável
e mesmo assim eu multiplico as risadas
pra te fazer um pouco mais feliz
e peço pra acreditar em mim
pra que eu mesma possa acreditar
pra que um dia eu resolva levantar
dessa cova rasa de onde eu vejo os vivos e os mortos
E pra mim eles não são mais do que corpos
Deitei no meu túmulo de vidro
e vc viu que eu ainda não estava morta
quando um calor me tocou
Eu só precisava de um pouco de atenção
Talvez um dia eu volte a viver
a acreditar
Talvez eu volte a amar
e a regar as plantas do jardim
assim como você me fez feliz
durante algumas horas eu vejo a alegria
e eu posso jurar que isso tudo é poesia
E eu posso rezar, pedir, implorar
que eu não agüento mais levantar e cair
Me leva daqui
eu quero voar
eu quero viver
e lembrar daquilo que eu nunca perdi...
a semente do amor.

Thursday, October 19, 2006

Trancada

E então aconteceu o inevitável
Eu me parti em duas
E isso era apenas o começo

Eu vivia muitas vidas numa só
Vidas sobrepostas cheirando a mofo
E aspirando o novo

Eu me inventava a todo momento
E minha platéia fiel
A tudo estranhava

Elogios que não traziam nada de novo
Críticas que não me faziam sair do lugar
Eu impermeável ao que vinha de fora

Encontrei um lugar dentro de mim
Em que consigo fingir pra mim mesma
Essa mesma que não crê nem fala
Apenas se esconde
Vagando pelos vãos das outras
Que saem voando como borboletas cegas
A cada faceta dessa personalidade obscura
Sob o manto da noite

Protegida de todo o mal
Protegida de todo o bem

Não é na rua
É na casa
Não é no fora
É no dentro
Não é nascer
É estar no útero pra sempre quente e macio

Trancada a sete chaves
Não estou nem pra mim mesma
Me perdi dentro de mim
Não posso sair
Apenas agendar visitas

Tuesday, October 17, 2006

Autêntica

A verdade é que nunca fui pobre
e fui me tornando cínica ao longo do tempo.
Nunca passei fome,
nem fui privada das condições básicas de subsistência.
Mas carrego uma carga pesada demais,
densa demais

Não quero contar da minha vida.
Isso faço todos os dias
pra justificar meus atos,
meus erros
e até mesmo o merecimento de meus sucessos.

Sinto em mim
a tragédia aliada à dionisíaca celebração da vida.
Mesmo que eu queira,
não consigo, não posso ser superficial.

Não pretendo fazer da minha obra
o "passar a limpo" da minha vida.
Para isso faço terapia
e acredito na psicologia
e sei também das suas limitações.

O que sou, quando sou, se é que sou
é um escancaramento de verdades
palavrões e rimas
gargalhadas e lágrimas.

Wednesday, October 11, 2006

Fragmentos de Choro Bandido

de Chico Buarque e Edu Lobo

mesmo que os cantores sejam falsos
como eu
serão bonitas
não importa
são bonitas as canções

mesmo miseráveis os poetas
os seus versos serão bons
mesmo que vc feche os ouvidos
e as janelas do vestido
minha musa vai cair em tentação
mesmo pq estou falando grego com sua imaginação

saiba que os poetas como os cegos
podem ver na escuridão
mesmo que os romances sejam falsos
como o nosso
são bonitas
não importa
são bonitas as canções

e eis que menos sábios do que antes
os seus lábios ofegantes
hão de se entregar assim"me leve até o fim"

mesmo sendo errados os amantes
seus amores serão bons

Monday, October 09, 2006

vôo solo

apague a luz!
não quero te ver, só te sentir

e então eu te beijei serena
tudo isso
enquanto a vida me interrompia

quando nossa noite amanheceu
éramos outros

não éramos loucos
não éramos monstros

apenas restos esquecidos
preenchidos de medo e descaso

um sorriso frio
um asco
um corpo murcho
um desencanto
carruagem que vira abóbora

uma vontade de não ficar
de não seguir
uma vontade de inexistir por alguns momentos

recarregar a bateria
bater à porta de alguém
mas eu mesma não estou pra ninguém

quando você foi embora
deixou um gosto ruim
senti falta de mim
onde é que eu fui parar?
onde é que eu vou me achar?

saí em busca de um outro espelho
e o que encontrei foi um surto
um susto
um desespero
um desejo de me consumir
e de sumir

tem certas portas que é melhor não abrir...

corri a maratona 100 vezes
vagando vagabunda na velocidade da tontura

e no olho do furacão
na boca do vulcão
encontrei a doença novamente

sim, a minha loucura
a perfeição de mim que me esbofeteia
cuspiu na minha cara
me chamou de feia

um vazio me tomou
e a parte que me falta emergiu
o buraco negro se abriu
engolindo tudo ao seu redor

depois veio a explosão
das portas fechadas desse lar-birinto em que entrei

consegui sair
voei por cima dele
e livre e leve eu louvo
- oh, fake love! -
as sensações de meu corpo mudo

os turbilhões
os aviões
eu voei

quando acordei estava tonta
caída no chão
ao pousar no solo um baque

e então uma mão amiga
um sorriso

me vi num espelho que não se quebrava

um brilho de sol
já é dia

quero voar de novo

09/out/2006

Wednesday, October 04, 2006

Insana_mente

De espelhos de mim
cacos de vidas,
amores, histórias....
palavras já passadas...
a limpo.

Palavras aliadas
tão frias.
Sustentam segundas vias.

São parte do imenso amor agudo
que às vezes sinto.
E eu não minto:
O sentimento é pouco intenso
sem força para formar lágrima inteira.

Estou pedindo para chorar?
Não que eu queira
Não parece que há poucos dias
tive crise de loucura.

Doente

Pequenas depressões em baixos níveis,
auto-análises são passíveis de curar.
Tranqüilidade pensou que tinha,
Mas o mundo não pára pra pensar.

Admitir que sou doente:
Tenho bichinhos aqui dentro
Tenho crimes em mente.

Sou vilã da história
Porque sem memória
Sem amor e sem vitória.
Encaro a escória
De sonhos que sonhei no hospício.

Foram tão bonitos...
Mas se sou louca
Foram desperdício

Palavra

Palavra

Perfeito
Defeito
Feito

Quase
um pulo
nulo

Dita
Repetida
Maldita

Palavra

haicais

Cai uma lágrima minha
Lembrança me invade
Começa a tempestade




.....




coisas de amar
foram coisas de doido
a cada poema composto





....




do prazer e do que amou
por um querer
que sem querer se misturou




....




Sinto
que ressinto
sentimentos que desminto




....




Aliso e analiso
que é de você
que eu preciso




...




dormir com você
e te dar de presente
uma vida inteira pela frente




....

Fragmentos de viagem

- Estou com Carlos na cabeça (ou no coração).
- Algo aconteceu?
- Acenda um cigarro que tudo passa.

São oito horas da noite. Lembra-se da viagem com Carlos? Com o “senhor” Carlos? Madrugada adentro, sem parar pra nada. A mesma estrada, hoje com luzes do pedágio. Nossos sonhos estão privatizados. O sinal abre, a ‘barreira’ levanta e estamos, de novo, um pouco mais livres que há instantes atrás, um pouco menos livres do que viemos no começo. Vejo o meu carro na pista ao lado no sentido contrário. É noite, estou voltando pra casa de ônibus Transfada. Mais alguns minutos e estaremos em casa. Tem um carro parado no meio da curva. Estamos indo para Ponta Grossa. “Tchau! Vai com Deus! Boa viagem!” O velho já foi embora. Foram embora os de Piraí... Estou aqui. Vou descer no penúltimo ponto: Ponta Grossa. Depois vem Curitiba e eles já vão descansar como eu. Minhas espinhas e minhas pernas ameaçam doer. A caneta continua a correr nas dobras do papel. Depois passo tudo a limpo no computador. “Lembra de mim, Sonia? Eu poderia Ter te ligado hoje... Será que a culpa é minha? Me escreve, me diz alguma coisa. Diz que tudo é impressão ruim... Você ainda me ama. Diz pra mim. Eu vou bem e a Denise? Sou sua filha, vê se não esquece.” Estamos indo de volta pra casa. Vê que os carros se levantaram da estrada. Estão vivos e em suas velocidades nos levam abaixo do viaduto. Agora nosso ônibus também passa pelo viaduto e num indulto esses carros nos levam a qualquer lugar mais para a frente, um lugar mais diferente do que podemos imaginar. Em cada carro, tantos destinos... Nesse ônibus só penso no meu. Não sei se digo, mas tenho atração por casas noturnas, boates, moquiços, prostíbulos, luzes vermelhas. Passamos no meio das plaquinhas amarelas..Queria me escrever na sua vida...
Estamos saindo de mais uma cidade. Parecem, todas essas saídas, as saídas de uma mesma cidade... Espumando, efervescendo, diluindo. A cabeça ficou igual ao tal remédio. Eu olhava os caminhões da frente, concentrava-me no pára-choque e eis que um choque me invade o pensamento, o choque de brilhar o brilho das luzes da cidade ao longe. Lombada. Atingimos velocidade das bicicletas-borboletas. Pessoas sem pressa respirando o ar noturno, olham acostumadas pro ônibus. De novo na estrada. Uma curva fechada, o caminho do meio e as casinhas na estrada. PARE. Lembra quando eu quis morar numa casinha na beira da estrada? Nem que fosse só umas férias, ou só um feriado... Saudades dos meus elásticos. Faíscas dos seus sonhos. Faíscas de você. De onde nada se esperava saem faíscas. Estou virando uma pessoa otimista? Caminhões, só caminhões na estrada. Uma cidade lá longe está acesa. Enquanto aqui no ônibus apagam-se as luzes. Nada me prende. Serei impessoal, mas rogarei a mia senhor. Maria do Anel, a lua parece imóvel e acho que acho algumas estrelas pra você. Maria do Anel, cadê a Lua? Acho que acho algumas estrelas pro seu anel. Acho que acho algumas luzes pro seu troféu. A cidade brilha a te esperar. Não espere. Declare seu amor por Ponta Grossa. Quando você chega a certos pontos da estrada, tem-se a impressão de que não se está sozinho. Fragmentos de uma viagem. Eu me encaro, me descubro e me conheço.

Dialogar com o impossível ou impossibilitar o diálogo

Infelizmente não são todos que deixam a porta entreaberta. Nem todos têm a chave de suas caixas de pandora. Nem todos... Me incomoda viver entre os que não têm aquilo que me possibilita o diálogo com eles. Eu sou o contrário das multidões enfurecidas, público pagante de shows em que todos ficam em pé, estudantes grevistas incitando os demais, sindicatos, diretórios estudantis. Não me sinto à vontade com eles. Por mais legítimas que sejam suas causas. Pra mim o que se massifica, perde o encanto. Eu pertenço ao grupo do não pertencer. Parcos amigos espalhados. Maneiras diferentes de se divertir. Eu sou como agulha de injeção. Quero entrar... nem que faça doer. Eu posso curar ou apenas deixar sangrar.

tempo de espera

Compasso de espera.
Um dia,
qualquer hora.
Quem sabe?

Não era
ainda a minha
a minha hora
e quem me dera...

O relógio...
o calendário...

Nada disso.

Sou apenas eu
parada.

Naturalmente

Enquanto você me desperdiça
sacudindo o lençol
Vou com o vento

E de repente
esse vento bate numa árvore grande
desfolhando sem querer

Eu
... e suas folhas...
... e os seus galhos...
... seus atos falhos...

sou pólen- flower
semeando as flores que você matou.

Monday, October 02, 2006

sonho matéria do sonho

um dia
não mais que de repente
o sonho, tal qual uma nuvem,
é atravessado por algo material
o sonho é atravessado pela materialização do próprio sonho
e é como todo sólido: desmancha no ar

Monday, September 25, 2006

entulho de nada

caminho por seu nome

100 ruas
100 risos
cinza e nebuloso

eu abro os olhos e não enxergo um novo dia
não abro as janelas nem respiro fundo

eu canso de ver ingenuidade no espelho
quero me cortar com esses cacos de mim

procuro no dicionário um significado
nenhum dilema
inexistir é quase sempre doce

sem sede
sem fome
sem gosto

jogos
poesia
lágrimas com cerveja

não estou precisando existir ultimamente
quando precisar, eu tomo a pílula

Tuesday, September 12, 2006

O ano


O ano que passou correndo
virei professora
correndo atrás de objetivos
objetos e objeções

fugi de mim
mergulhei nos fatos
e os retratos envelheceram.

Quando o ano começou
eu era muitos.
E de repente parou.
E seguiu outro rumo.

O inverno foi rigoroso
exigente
e me trouxe de volta a preguiça
e eu parei pra me olhar
por dentro.

Meio de setembro
gente nova
novos problemas

eu aqui remexendo o vazio
e encontrei ninguém.

era saudade.
e virou poesia.

Sunday, September 10, 2006

Meu espelho diz

Se alguém perguntar, eu nego.
Meu espelho é você.

Espelho, espelho meu...
Será que a vilã da história sou eu?

Não, porque sei que te ajudo
E issso, por ora, me redime.

Todo mundo erra,
mas eu...

eu me divirto com meus erros!

Eu tendo a mostrar
as minhas garras logo de início.


- Eu -

vestida com as roupas
e as armas de Jorge
...não sou Jorge,
mas luto.
Não sou dragão,
mas cuspo fogo.



- Eu -

sou a princesa no castelo
esperando alguém me salvar.
Mas quem me salva
não é um príncipe
E sim um ogro verde desencantado.

E eu, ogra,
vivo feliz para sempre

com minhas farras
de cerveja,
carne vermelha
e lençóis.

Thursday, July 06, 2006

A Volta ao Mar

Quando sentei na areia
Senti o cheiro do mar.
É a 1ª vez que venho aqui
depois de você.

Tanta coisa aconteceu.
Essa coisa a mais que é você.
Mas o mar continua lá.
E você continua aqui.

É assim mesmo.
Eu mergulho em mim.
E nas profundezas do mar,

Abrir os olhos e ver a vida,
a civilização que existe dentro.

Ainda está salgado e ardem meus olhos.
Mas sentei diante do mar
E chorei as gotas do mar que mora em mim.
É realmente difícil acreditar no fim
Quando se vê o mar.

1998

Cinderelas

Isto que chamam palavras
Isto que os fazem chamar
São elas,
Cinderelas,
as palavras que mancham
e desmancham no ar.

Brotam da alma do mundo
Do mundo que não tinha língua
Do mundo que não tinha gente
E o mundo continua o mundo
E a gente continua a gente.

Gente é ser complicado
Tem gente que fica quieto
quando fica irritado
Tem gente que fala tudo
e ainda sente que faltou falar...

LEVE

LEVE
ISSO DE RUIM DE MIM
E ME DEIXE AQUI
SEM MEDO.

LEVE
A MÁGOA COM ESSA ÁGUA
E ME DEIXE AQUI
COM TUDO.

LEVE
O LEVE DESESPERO
E ME DEIXE AQUI
COMIGO.

LEVE
ALGUÉM PRA ESSE ALGUÉM
E ME DEIXE AQUI
DORMINDO.

QUANDO EU ACORDAR,
ESPERO TER ESQUECIDO.

ANTROPOMORFOSE

Você ouviu o que disseram os deuses/ Você ouviu o que disseram os homens.../ Não era acaso do destino,/ era encontro de pensamentos.../Não era balada de amor,/ era a toada desgraça./Aquela que toca os nervos./ Aquela que toca na pele./ Um misto de interesses./Uma razão que não tem dono./ Era só pra despertar teu sono./Era só pra arrepiar teu corpo./ Era desejo desmedido/ de querer o impossível./ Era mentira bonita /inventada a contento./ Era história amiúde/ de histórias de muito tempo./ Era a face Bela,/ própria face da Beleza./ Era o fechar de olhos. /Tateando a incerteza./ Era um mistério fecundo,/ ausência que transbordava./ Amalgamar de caminhos/ num lugar inexistente./ Era união dos defeitos/ de pessoas insistentes./ Era agora sua vez. /Era hora de aprender. /Pudera ter sido a sorte /azarada de encontrar.../ Os erros das próprias palavras,/ do silêncio e da lascívia./Um punhal afiado,/ sangue solto flutuando./ Também vieram as lágrimas/ - já se foram ainda bem.../ o desejo só consome. /Ele vem sacia e some./ O desejo era volúpia,/ um arder entorpecente./O desejo era produto/ de produção consciente./ Difícil sentir desejo /e dizer que nada sente.

04/mai/2001 22h35min

Meus poemas de amor

Amores são muito mais demoníacos,
muito mais amorais,
muito mais depressivos
do que ficar dialogando com o mundo,
xingando quem não se conhece

Amores sacodem sua vida
Te enterram no chão
Amores assombram suas noites
Chutam seu rosto contra o espelho
para que ele destrua as imagens de sua face
e dela vertam sangue e lágrimas
produzindo um caldo salgado
que você bebe com dor e gozo
Enquanto sua carne se corta

O amor que eu conheço
não pinta coraçõezinhos no caderno
Nem pede em casamento
O amor que conheço é um vírus
que produz em você sensações viscerais

o amor também te faz cagar
o amor também te faz escarrar
o amor também te faz ir se danar

o amor não tem nada de pueril
o amor é um bicho ensandecido de fome e cio

Já que você não o conhece..
Vá viver à toa por aí
pois não há perigo algum de meus poemas
alcançarem e atacarem
você, o ser sem sentimento.

o que vejo

Me vejo linda no espelho, de óculos de quem está estudando, lendo, tendo idéias, trabalhando, sendo útil à sociedade, fazendo o que sabe fazer, no maior charme, no maior estilo. Vejo meus olhos um pouco ressentidos de toda a dor que eu lhes causei. Vejo os cabelos um pouco dourados, um pouco presos, um pouco rebelados. Vejo a limpeza do banho recém tomado, depois de todas as águas, menos a tua água. Como se eu descansasse, chorei, chorei mesmo, e daí? Vejo a seriedade e a profundidade dos pedidos que faço a mim mesma quando me olho no espelho Um pouco de orgulho por Ter escrito sobre as palavras, algo que eu não lembrava mas teve cor. Eu preciso me expressar nem que não entendo preciso contar nem que seja pra mim preciso exercitar nem que seja pra voar... que futuro? Sim minhas mãos compridas, finas e femininas, combinam com meu rosto e minha fisionomia. Mesmo que não esteja sozinha, posso cavar minha privacidade, coisas que me digo, finalmente depois de muito viver, viver, viver sem pensar. Mesmo errado, mesmo caminho cruzado, sei que é caminho pisado, não fico esperando a vida passar. Senão ela vai sem mim. E eu fico. Não posso ficar, não sou de ficar. Não sou de ficar por muito tempo.

Não sou filha de ninguém

Não sou filha de ninguém
Não tenho pai, nem mãe,
nenhum vínculo
Sou uma sombra,
Um reflexo no espelho
Uma lembrança de alguém que não existe mais.
Quando as coisas acabam pra onde elas vão?
O nada é um buraco negro pra onde tudo está sendo sugado.
Existe um buraco negro no meu coração
Sugo as coisas até acabarem
Bebo a seiva até a última gota
Aí elas se alojam no meu peito
e eu continuo não existindo
Não sei quando foi que morri
Não sei quando foi que esqueci de viver
Esqueci o silêncio eterno que ficou
Depois que não conversei mais c/ Deus
Não existe espelho
Não existe imagem
Não existe nada
Só existe o nada
pra onde estamos sendo jogados de um lado
pro outro nessa viagem desconfortável.

Estou no céu porque mergulhei na minha fantasia.
Estou por entre nuvens porque quero estar.
Nuvens azuis, cor-de-rosa
Não tenho sentimento
Sou nuvem
Tudo passa por mim
o vento, o sol, a chuva
Estou sozinha
Não tenho com quem brincar.
A peça acabou
O pano baixou
E eu não desempenho meu papel.
Aplausos congelados.

Não sei como as pessoas conseguem continuar existindo
como robôs como coisa qualquer
Não vou molhar de mar
Não vou cheirar o sal
Nem vou olhar o céu
Nem sol, nem calor
Nem pássaros, nem voar
Não vou viver de ar
Não vou respirar
Acabou o ar
Não vou lembrar
Não vou esquecer
Não posso ficar
Não posso esconder
Os outros não existem
Inventei uma vida
Inventei um amor
Inventei uma pessoa
Inventei a mim mesma
Mas cansei de inventar
Cansei de pensar
Cansei de existir
Cansei de tentar entender
Cansei de pagar pra sorrir
Cansei de chorar pra sentir
Cansei de acabar
Cansei de procurar
Cansei de achar e perder
Cansei de tentar me encontrar
se não sei onde estou
se não sei quem eu sou
como saber pra onde vou?
Como acreditar?
Como acreditar que sou alguma coisa importante?
Como admitir os outros, eu, a vida?
Como gostar de sofrer
Gostar de chorar
Gostar do fracasso
Um canto escuro onde eu possa existir,
me queixar, gritar, xingar o mundo
E continuar só,
Existindo eu
Existindo a dor
E jogando todo o resto no lixo
Jogando pra fora o cor-de-rosa
Me entregando pro céu,
alcançando uma estrela infinita,
sendo eterna como um momento vão,
um momento ínfimo que se repete a todo momento
fazendo uma rota no espaço
fazendo um desenho no céu
um rabisco no papel.
Ser feliz com água e vento
Ser feliz chorando todo dia
Ser feliz arrancando um pedaço todo o dia
Ser feliz com o sentimento de saudade
Lembrança doce tormenta
Tenho nojo disso tudo
Mas também estou fugindo,
me escondendo de Deus,
me escondendo de você,
até que eu vire nada novamente
até que eu vire estátua permanente
até que eu vire um algo jogado,
entulhado ao lado de outros nadas
outros lixos, outros fins.

eu céu negro

Fecho os olhos e enxergo o espaço sideral.
Mas não existem estrelas brilhando aqui dentro.
Aqui tem algo morrendo.
Talvez seja o fogo queimando.
Talvez as feridas abrindo novamente.
Todas têm seu tempo de curar.
E eu escondo as cicatrizes pra não lembrar.

comigo mesma

não tenho muito medo

perdi a capacidade de me lamentar da vida
de amores mal vividos
perdi a capacidade de me acorrentar a decepções

minha história é importante pra mim
gosto de esclarecer as coisas dentro de mim
fora de mim não é problema meu
eu fecho a janela pra não me perder por aí
eu fecho as cortinas
e me sinto à vontade comigo
desde muito tempo

a cada dia coleciono mais adjetivos
para essa tarefa interminável: me descrever
adoro falar sobre mim
adoro me reconhecer em outros espelhos
que não reflitam essa imagem óbvia instaurada na retina
eu me amo e sou correspondida
e isso me faz feliz

Sentimento sintetizado

O amor é uma palavra banal
E se você pudesse tocar o sentimento
Saberia que o amor é uma palavra banal
Eu odeio as representações do amor
As novelas que engulo todos os dias com água e farinha
Os musicais da Broadway
Os Ballets do Bolchoi
Todo o lirismo que existe em mim
fruto dessa constante exposição
a essas representações fabricadas e banais
Desejos frívolos e suas conseqüências

E a vergonha que sinto dos meus sentimentos?
Quem vai pagar a conta do analista?
Quem vai preencher o buraco entulhado de nada
onde as coisas acabam
e se tornam esquecidas pelas sensações?

Esse mistério em que me escondo
E nunca me procuro lá

Desejo é não saber e entender tudo.

Manhã em claro

Amanheceu
E vc não está aqui.
Talvez esteja correndo atrás de satisfação.
Talvez queira se sentir importante ao suplicar algo
com a fisionomia mais despretensiosa do mundo.

Sou abençoada.
Quero me compartilhar.

Sou faminta pelo seu olhar de adorador.
Tenho admiradores.
Mas quero ser tocada bem fundo.
Talvez pra estragar de vez.
Mas não acredito que meus sentimento fênix
possa deixar de renascer.
Meu sentimento pelo mundo é soberano.

Talvez um dia eu caia,
tão fundo, forte e violento quanto o que eu senti.
Talvez tão torpe, ordinário e desnecessário
como o que ocultei.
Talvez tão simples e inevitável
como o que sou condenada a ser.

Não acredito muito em pré-destinação.
Acredito em energia móvel
e é por isso que temo o eterno e o efêmero.
E é por isso que rezo cometendo erros lindos.
E é por isso que tento alcançar o eterno
a partir do que é cotidiano,
e o que é e sublime
através do que é efêmero.

20 minutos

E você chegará como um príncipe indeciso
Meu príncipe imperfeito
Fazendo promessas falsas
Com o cheiro de torpor que carrega em si

Sou feita para a sedução
Sou feita para seduzir
Sou feita pra dormir e acordar desse sono
Desse sonho bonito que não existe

Sou produto de mim mesma
Quero você servindo minha mesa
Quero o raiar do sol na testa
Quero a oração da manhã
Maior e melhor do que eu

Eu posso até regurgitar
O que tanta bondade me trás
E assim peço um pouco do veneno
Ao contrário da picada da cobra
Peço o veneno para me fazer normal
Pois se a pureza,a beleza e a bondade me habitarem
Serei eternamente insuportável

Por isso quero sua humanidade
Sua austeridade
Sua gratitude
Porque te fiz sentir o melhor e o maior
Porque te amei durante 20 minutos

Audição

O que você sente com essa música?
Não me dá saudade
Me dá uma sensação que é minha
Te cheirar e dançar com você
por esse universo afora

É isso o que vai me fazer resistir
à brutalidade do dia a dia
É isso o que vai me fazer
não sucumbir à solidão

Eu quero você
Desejo você
Encontrei você
E fazer o quê?

Talvez eu só consiga falar sobre o meu desejo
Talvez eu só consiga ter compaixão e ódio
por aqueles que me desejam sem me conhecer,
sem me dominar

Por excesso de exemplo violento,
por excesso de exemplo passivo
Não sei qual me apetece
Não sei como te apelar
Não sei como te estuprar
Não sei como chorar pela sua violência
Não sei como reclamar a sua ausência
Não sei como te isentar dessas repetições
Não sei como me libertar de todo o aprendizado emocional
Não sei como te sentir sem saber o que sinto

Mas é o que desejo
Sem assumir socialmente, sem nada
Só sentir o que não entendo
e me satisfazer sem querer
Porque quero descansar em você
Só porque te amei como algo bonito
Só porque aspirei sua beleza
Só porque suspirei

voltar

você não vai voltar
não vai voltar a ser o que era
e eu
talvez eu volte a ser o que era
sem essa peça que falta

Wednesday, July 05, 2006

Sobre minha poesia

Talvez falando sobre mim
não seja essa coisa óbvia de "me entendam"

Eu me apóio no "eu lírico"
Eu sei - e como

Seu discurso é normativo
Você pretende alcançar uma verdade geral, universal

Meu discurso é em primeira pessoa
As verdades que digo são minhas
Fruto das minhas construções

Assim como as canções
Assim como as novelas
Assim como os filmes

Meus poemas são uma verdade delimitada e particular
E a publicação deles...
Talvez eu não queira ser tão admirada
Porque a mim basta o prazer de escrevê-los e lê-los
E mais: de vivê-los

Talvez não me interesse corrigir as possíveis leituras
que as pessoas fazem do que chamo de meu mundo
Eu quero que quem leia o faça de modo particular, intimo
na solidão de seu mundo
Eu quero que outros eus se identifiquem, se reconheçam, se descubram

Quanto à minha falácia sobre estética...
A estética de meus poemas é algo como canção
Não posso deixar de ter ritmo
Não posso deixar de cantar palavras,
nem de fazer jogos de palavras fazendo com que elas
- as meras palavras -
adquiram nova configuração
Elas que ecoem no mais fundo das impressões

Eu pego o que está pairando no ar
E roubo pra mim
E imprimo nos poemas essa minha experiência

Estamos nos escondendo demais por trás de supostas opiniões literárias