Wednesday, September 19, 2007

EX-PURGANDO NO PURGATÓRIO

Talvez não mais desejo seu corpo
Mas sua voz ainda ecoa na minha lembrança
E sinto em meu ventre as vibrações do toque
grave, suave, compassado e aerado
que o seu jeito de falar ainda me provoca.

A sua boca era a mais saborosa que qualquer fruta
pois de cada mordida, sucção ou lambida
era só o gosto dos seus lábios e saliva
que me trazia o gosto inefável
fruta que jamais acaba
não amadurece nem perece
fresca e envelhecida
boca eterna
trazendo sempre o gosto primeiro do primeiro beijo.
Sua saliva grossa como seu sêmen.

Nunca jamais doce brincadeira de enjoar
seu amargor sereno
água salina de lágrimas e sangue.
Doce, amarga
pobre, nobre criatura
príncipe plebeu,
animal sagrado,
criança enfurecida,
ferida aberta.

Seu coração é meu.
Eu lhe lambi todas as feridas abertas.
Eu lhe cantei e lhe fiz cantar todas as orações profanas.
Dignei-me e indignei-me a lhe proferir as palavras de luz
que os mortais apenas se habituam com a sombra da clara ofuscante idéia
idéia vaga para eles em nós se fez real.

Porque pudemos contemplar o infinito
debaixo de mentiras ensaiadas
Porque da nossa fantasia
ninguém ousou duvidar
Porque das vestes me despi
e ainda assim havia a mesma aura.
Porque te usei e lhe fiz meu brinquedo
- encaixe perfeito do mundo novo que nascia em mim -
Porque nossos olhos fugiam do encontro
Porque fomos distraídos mesmo resistindo
Porque eu nunca consegui deixar marcas na sua carne
Porque atendi aos apelos do seu corpo
Porque acolhi um novo homem que nascia sõ pra mim
redescobrindo o novo caminho
do atalho errado que o fez se perder.
Porque das coisas mais escuras, das coisas mais inesperadas,
dos momentos mais inexpressivos
uma horrenda luzde bondade, esperança, encanto, suavidade
nos invadiu sorrateiramente.

Quando apartados a desconfiança, o medo
as inseguranças, os traumas,
os rancores, as vergonhas, a descrença
fazia pisarmos o freio
esquecer os gritos do peito dilacerado implorando por amor.
Talvez um amor de irmãos
pois era no brilho dos sorrisos,
na luz amena dos olhos,
nos abraços apertados de chegada, de saudade,
reencontro, despedidas
nas mãos que não queriam agarrar nada,
nem possuir, nem macular a carne com garras afiadas.
mãos que só sabiam fazer-se e desmanchar-se em carinho
que indicavam caminhos confusos, incertos
porém o gesto era tão certo
que só poderia ser pecado não seguir a sua orientação.

Os desejos se confudiram
fomos muito mais do que deveríamos
por isso esse castigo incontido incontinente inconsciente.
Do abrigo a proteção mútua e muda
apenas fogo, fumaça e cinzas.
E o pássaro que me tornei voou chorando lágrimas doces, ternas
que secaram com a brisa etérea e envolta em ares outros
de mãos de vento me trouxe até o vácuo: o esquecimento.

1 comment:

Mariana Rovida said...

Fazia tempo que não passava por aqui... me arrepiei novamente...